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terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Do amor.



I

E há no mundo amor?
Meu amor me ama?
Quando Adamastor,
Amordaçado na cama
Ama.

II

Há no mundo paixão!
Desvariosa chama!
Fogario que ama,
Amor amado no chão
Cama.


segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Passagem n°2

No jardim há uma fonte e estátuas,
Brotam da terra fortes arames farpados, também de pedra
(E o seu musgo verde tem um ar dourado)
A fonte não seca - rígida - gospe soberbia
Perco-me com o avião no ar insensível
Enterro-me em redoma de marfim

- No meu quintal corre um esgoto e seus fragmentos.
Boiam pedaços de vida, também, às vezes, mortos
(E o seu calor tem um cheiro risonho).
O fluxo cortado revela - seco - gargalhadas.
Vejo não só, meus parentes, esterco,
escova de dente, cacos de vidro, diamantes
empalhados...

domingo, 9 de dezembro de 2007

Exercício n°3

Os verdes traços reforçam o lenço
estruturas metálicas adjacentes ao limbo.
O borro de sangue dilui as perguntas,
a mácula, verme, se choca com o escaninho.
As lâminas, a clara, a lã, me vibram. Tenso
repito o rito, penso, e volto ao assunto.

Da estilística fônica.



I

Afinado alfinete
Alfinetada afinação
Sonoramente ação
Saboroso estilete


II

Vezes desafino
Todo o desatino
Do olor cíclico
Vago-específico



sábado, 8 de dezembro de 2007

Exercício n° 1

Assalta a porta, de mansinho, se insinua.
Areia molhada escorrendo. Escorrendo por dentre os dedos.
Estaca. Mesmo em casa conhecida há sangue.
Com sua arte (plástica) repele o movimento.

O movimento alheio cessa, agora é todo teu.
Percebe, má intenção, se eriça e camufla.
Devagarinho reassume a antiga pose.
Mostra garras, dentes, vida e sorte.
Arisco, mete-se entre as pernas
desgostas o inventário
e some.

Pára, apura olhos, ouvidos - não é o trem -
e gosto. Ronrona de leve, roça
de leve, sem pressa, tem fome.

domingo, 25 de novembro de 2007

sonho que me torno

Te senti durante o sonho
Te sinto agora, o sonho
deixa o rastro de Saudade forte.
Dolorida é a Saudade e seu sorriso
no sonho.
Fico na dúvida: mas sei que gosto de cabelos negros.
Bem negros, bem pretos, preto espelhado...
que reflete o meu olhar dolorido de Saudade
De Paixão intensíssima, em chamas, doloridíssima!
Os seus cabelos cacheados frisam:
frisam o que sinto, frisam o que faço e frisam o que penso.
Ainda mais o que sonho.
Ainda mais o que quero.
Ainda mais o que não quero.
Ainda mais a minha dúvida.
Outro cabelo negro, preto, preto, me encanta.
Esse não frisa: alisa.
Alisa meu sentimento esquisito: torna-o terno.
Alisa minha Paixão pecaminosa: torna-a sacra.
Alisa minha dor que não se explica: explica-a.Torna-a sobre-[humana.
Alisa meu Arrependimento: torna-o Saudade.
O Arrependimento e a Saudade são seres sádicos.
Apesar de que fui eu quem buscou: tornei-os Eu.
Não sei se prefiro o fruto da serpente, frisando, ou se quero a [ternura: aliso-me?
Sei que ambos os cabelos são negros e nenhum tem camadas: [têm unidade,
o que me deixa pior: gosto dos fragmentados.
Mas caso-me com os normais: este é o meu sonho.
Busco ser normal e tranqüila: busco ser lisa. Cabelo negro e liso: [ó, Natureza!
Os frisos me confundem: ó, Demônio.
Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos da loucura.
Afinal, é por ela que escrevo, é por ela que vivo, é por ela que [duvido.
No fim, fico com ambos: frisos e lisos, ambos são negros, ambos [brilham.
Mas um está aqui chefiando a dor, o Arrependimento, a Saudade [e a tentação libidinosa do adultério.

O outro está na parte de fora: liso, clássico, regrado.
O chefe da dor torna-se longínquo e dolorido. Torna-se [sonho.Torna-me humana.
O outro não: chefia a vida cotidiana: e quem dirá que não é amor?
Esse, terno, torna-se amor. Torna-me amor.

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Soneto mal-feito aos meus dois maridos

Eu e meus dois maridos: ficando quieta,
Sempre íamos além: nos amamos:
o marido 1, coitado, era poeta
O 2 também: aí então calamos.

Um dia fiquei sem eles, na certa:
Ambos, claro, desposaram alguém
Um arrumou, raios, uma poeta
E o outro não: antes arrumasse também.

Detesto fofuras: o marido 1 é que gosta
Mal sabe que escrever já é uma bosta
Disse-me ele outro dia: és obsessiva

Gosto de neuroses, gosto de ser exaustiva
Cadê o marido 2? Está ocupado na prosa
Nunca vi falar tanto: Deus o livre da trova!

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Freezer

I

Mecanismo pela conservação
dos sólidos, pensa que coagula
o líquido perene, não em vida,
em morte, imobilizadora e fria.

II

Conservas o frio - desconfiança - que
já não há. Reprimes o calor fugidio que
lacera as prateleiras estanques,
constroi o iglu em pensamento

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Descoberta

Te olhando...

Achei ainda um pouco de você
no seu cabelo repicado: a camada de baixo
é o você que eu queria ser.

Achei ainda um você no pouco
Cabelo da camada de baixo!
do seu cabelo repicado: eu também estou lá...

Achei ainda um pouco de mim
a camada de baixo, ela ainda me guarda
seu cabelo em camadas, corte que dói: dói porque tem memória!

Você me chamou pelo nome num dia de cerveja.

Achei ainda você deliciosa – antes já achava,
mas agora, tão intocável, seu sabor é maior.
E é Ele que te chupa: ainda que eu veja mais fundo na sua sobrancelha grossa.

Selvagem!

Achei ainda você mudada: seu cabelo tem duas camadas
A de baixo sou eu, quando ainda eu.
A de cima é você: quando no agora impossível.

Agora indigesto! Indigesta... Em ti testo meu eu... Sexy.

Achei ainda você Santa – gostosa, charmosa, de boca flexível e vermelha.
O cabelo de baixo é você quando viva.
O de cima é você na pretensão de ser oooutra coisa.

Achei ainda você intelectual
No seu cabelo repicado: mas é burra!
Porque finge e não é: é Espelho.

Achei em você, ainda, o que eu queria ser
falsa, pseudo-sensível, puta, mas misteriosa:
Aquele que te tem também O desejo.

Achei um pouco dele em você...
Só nas finas camadas de cima, no cabelo mais curto.
Achei que quisesse, ainda, deter o gosto d’Ele.

Achei a, ainda, Verdade: no seu cabelo!
Nele, sempre quis ser você, te chupando pra te ter.
Pena. Não dá.

Achei ainda melhor contentar-me com suas sobrancelhas
Expressivas que são, só elas, em você, são de Verdade.
Seu cabelo repicado em pedaços me dói.

Achei que seus fios de cabelo me doessem.
Porque mistura o outrora, lá longe, o ontem e o agora. E meu sonho.
Mas a Verdade é outra: dói é não ser você.

Selvagem!

explanações

Cavando a cova,
Vivo intensamente, em pensamento, a covar.
Esperar minha caveira
remexida na cova,
Porque ser osso é bom!

Ser osso só serve para comprovar
que a carne, em carne viva, vive pra covar. E cavar(-se).
Calada devo ficar, agora, porque odeio dizeres
aqueles trabalhados como ouro na arte poética pobre!!!
Arte é cova: fazê-la é cavar, saiba!

Pego a boneca e brinco os meus cinco anos,
tempos em que cavar a cova era natural...
O medo veio e coube na cova que cavei
Pra mim, pra Ele e pro nada que vim fazer
aqui, nesse mundo corcundo e carcomido.

Cansei-me de metáforas
Enterro o poema, mas revivo a Vaidade.
Por ela, quero ser porca e morbidamente estudada na Universidade (burra)
– que é uma cova –!fosse pela arte minha cova
Eu enterraria é tudo!!!

Cavei e enterrei a mim mesma.
Tenho medo de sonetos, dessas coisas assim,
de professores de arte, dos alunos deles... (você não tem?)
Nós somos os capangas dos doutores
que matam a arte, mas não cavam a cova.

Observações:
1. o poema feito aqui se transforma. Tudo para mostrar que cavar a cova é melhor que fingir. Cova cavada é sempre verdadeira. Uma vez tido o buraco, nenhuma terra estrangeira o tapa ou descava.
2. Tenho medo de tônicas e átonas em seqüências fofinhas, de rimas e essas coisas todas. O medo me comanda e pergunto: pra que tudo isso? Uma vez enterrada a Universidade – nada universal(izante) –, encontro funções – nem devia haver tal necessidade, mas o neoliberalismo econômicoartístico pede. Mas não digo muito não.
3. Função: mostrar a verdade àqueles que não estão contentes. E porque descontentar-se? Pra fingir que se cava, de verdade, a cova. No fim, tudo é dissimulação: e isso deve ser guardado e enterrado. Hein?! Faz de conta que somos.

domingo, 18 de novembro de 2007

Quero-quero

I

Céu límpido, sol implacável,
no campos, das vagas gordas, árvores verdes
bezerros brincando de cabra-cega,
esperança, galinhas, laranjais...
Cerca.

II

A música do vizinho
parte o muro e me acua
as pombas cantam. A rua
exprimida pelos prédios...
Obstrução à vista.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Sina



I

Assim a escrever sou forçado.
Solitário na sala sentimento
Sussurro o som descompassado
Do meu sonoro batimento.


II

Escrevo o escrito traçado
Nas estrelas, céu pensamento,
Silvo de meu ser antepassado
Preso a Sereia d'amor ciumento.


segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Nublado


I

Há dias em que me perco
Quando tua pura retina,
Que sempre foi meu cerco,
Cega-se em minha neblina.

II

Dia que se molda noite,
Eclipse, cósmica cortina.
Ânfora da luz de açoite.
Neve em nuvem fina.


domingo, 4 de novembro de 2007

Fim.


Mostra-me tua face pálida
Que mata a memória antiga
Presente na vida esquálida,
Enrustida velha cantiga.

Sabe-se. O passado foi
O velho vento que tarda.
O futuro rumina o boi
Pro presente que aguarda.

Não mais se atina
para a pura paródia,
A semente vespertina
Memória doutro dia.


Flerte fluído



I

Numa noite de inverno
Acenou para mim o vento
Vermelho velho interno
Do eterno lamento

II

Acenei eu ao vento
Com pássaros memória
Plomoroso pensamento
Azul ave história


sábado, 3 de novembro de 2007

O amor

I

O amor não é tão somente o amor é o antes, o anuncio do amor, frio e desesperado, sem guarda-chuva sai, as ruas são seu destino. O amor, ah o amor! é a tarde que cai que desliza suave como água na garganta... O amor é miserável e sedento como um cão é em sua desatada janta. Junta os cacos com cimento e as unta com seu pranto, mas não adianta. Não, não é anuncio frio de jornal do dia, é, antes, de ontem, inevitável e desatada sangria... Não há destino cerca, é necessário que se perca o amor que suave como os cacos ciumentos se faz sanguinolento como hinos e não hámais guarda-chuva - como se cobre a lua? - se desliza em intentos... Ah o amor
.
II

O amor não é tão somente o amor é antes o não amor que soa como pressentimento da dor, ou do alento, talvez seja uma bandeja com uma cabeça dentro? Ah sim, falava do amor com tanto fervor que estou ao relento... e olho a lua tão grande como a sua, de suave e sedento...Se os poemas são hinos que clamam os destinos melhor não lê-los e se abusam das rimas, torpes terminam e sempre se percam. Para o amor concreto - de construtores e sem tetos - só faltam as pedras. Essas são minhas! Jogando pedrinhas esqueço as migalhas... Oh pássaros miseráveis, sois cães voráveis! Se me findam a folha das árvores de um dia que cobre a lua e o jornal derruba com cacos sem vidro.

III

O amor não é tão somente o amor é antes um sonho que de agradável e tristonho se faz num lamento. O amor é um hino, em sua percussão há um sino que emite o cheiro da neblina, lisa e fina como um fio de cabelo. O amor é um fio de violão e de camisa que ao toque desliza e surpreende o vento.O amor é uma fragrância da cor da estância onde moram os passarinhos que vivem ao relento e seu ninho de suave e sedento é o pai da ignorância e todos são filhos do vorável destino sem teto, que tranqüilo descansa na garganta da infância de um dia como outro jornal - que melhor fim, afinal? - que o janta em cacos de papel.

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

KEEP COOLER

Os frisos do vinho.
Tinto frisante de mesa, de carro,
errantes os teus frisos
Do cabelo, hoje escarro.

Hoje barro, hoje cinza, hoje frisos
de saudade, é ela quem me mata.
No carro, outrora, teu friso me arrebata
O vinho era eterno: frisava.

Frisando, te amei (sem saber)
Hoje sei – sem te amar, sem poder...
No carro te amei, te soube, te bebi.
Você e o vinho, frisante poesia que senti.

(Que sinto, mas que finjo
não saber, não amar, e tinjo
teu cabelo com os frisos do vinho
tinto de mesa, de carro: de você, meu ninho.)

Não quis seu peito, meu escarro
foi pra você, eu, bêbada de vinho
tinto de mesa, de libido, de carro.
Tinto de escarro era meu amor. Louco.

Louca sou eu, de saudade dos frisos
do vinho, do teu cabelo em nó cego.
Enrolo a língua no vinho, e te nego
Vinho tinto em cabelos frisantes.

(hoje escarro, barro
cinza tinta, vinho seco
de mesa, hoje vinho.
Hoje escarro, sem carro, hoje amor, hoje nada.)

Término

Acabou. Fechou.
O passado se foi,
Esvaiu-se. O cotidiano
ficou, redobrou,
surgiu-se. Forte e indomável,
permaneceu, fortaleceu-se.
O meu suicídio.

Pretensos pretendentes

I

Cansei dos pseudo-poemas,
Tuberculose que se adora.
Obnoxiosos enfizemas
Da poesia bajuladora.

II

Triste que carrega a cruz
De não podendo ser poema,
Como quem não é avestruz,
Contenta-se em ser ema.


sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Terminal

Parado e só, aguarda o tempo,
sem pressa, guarda o instante.
Não espero pela amada de outrora,
não imagino a virgem escultura.
Anseio o ônibus... os passos em volta
me perdem, não mais que os em mim.
Não compreendo os rastros, remetem relâmpagos
reluzem inexatos. Fogo e frescura e tumidez
indagam seu retrato. De que falo?
Dos passos, do eco, do ônibus... minha casa.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Tempos Modernos

Espero, o relógio bate angustiado
e a ânsia me devora internamente.
Dum carro que passa veloz
sai a mulher de saia vermelha
e o rodar de sua saia obscena
tinge meu corpo de sangue.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

A poesia procura(-te)

Tragédia em dois atos

Monólogo que funciona como prólogo: início da tragédia

Não busque poesia na sua fala,
mentirosa e comum,
Cheia de pompas e erudição,
Joguetinhos sem razão, rimas pobres
terminadas em ão ou qualquer outro sufixo:
pobres porque mentiras.

Paulo Autran comove a mim,
a você, seja teatrando ou não;
isso porque, sem erudição, ele fala
simples, puro e o principal:
é de verdade.

Você não comove ninguém
seus simulacros são mentiras
os dele eram de verdade, verdades
simples, bonitas e, por isso, cruas.
Cruas e, por isso, poéticas.

Sua erudição não é poesia.
Poesia é a sensibilidade d’Ele,
O Paulo Autran comove, consegue, condiz seu olhar
com o que a boca finge pronunciar,
mas não precisa: porque a verdade já está.

O simulacro dele é poesia: não afirme que a flor do campo é poesia.
Deixe esse romantismo patético na grama bosteada do pasto: a poesia ainda não está aí.
O que é, afinal, simulacro e poesia?
A poesia são as verdades que ninguém diz.
A verdade é o simulacro que não diz: é.
E quem enxerga o óbvio?
Não, não são os poetas: é o teatro. É o profeta. O teatro é a poesia.
Mas não cantes, ó erudição, os palcos, portanto.
O teatro é mais que isso: o teatro é poesia.
Faça teatro e fará poesia: faça teatro na poesia,
Fale a verdade que só os profetas enxergam: e só eles
enxergam o óbvio, não é, Teatro Moderno?
Fale a verdade que só o ator (que é poeta por excelência e não deve fugir) é.


1º ATO

(papel e caneta, nada de penas e tinta-nanquim... Deus o livre!)

Por que cantas tua cidade, tua idade, tua infância, infanta mimada e mentirosa?
Por que cantas a Modernidade (ou para ela), a tradição,
a merda mística do período artístico?
Deixe-os em paz:
A ninguém importa tua inutilidade.
A ninguém importa o que você sabe sobre arte.
A ninguém importa o misticismo da poesia:
a todos importa ela mesma. Nua e crua!
– Sem trocadilhos pobres, por favor.

Não faças poesia sobre passado algum:
a quem importa o interior barreado cheirando a merda de cavalo?
Não busques poesia de paisagens, já inventaram a fotografia:
não simules uma fotografia: a poesia não é isso. Nem registro nem imagem assim.
É outra coisa: outra imagem menos fixa e erudita.
Esqueça, não busques, ó erudição, poesia na mulher amada.
Mal amada é que ela deve ser: é só gostosa e pronto...
Mas não é de verdade: e tem que ser de verdade. Senão
não é poesia.
– Mas veja, ai de mim, que tragédia... O que é poesia, Mitropoulos?

Não interrompas a verdade, ou interromperás
a poesia, ainda que besta... Cala-te e faz
a verdade ser ela mesma, sentindo o ar que nem te passa,
mas joga os cabelos para trás. Entendeste, ó plagio de
Jean Tardieu?
Busque o teatro no caminho, na verdade e na vida:
Encontrando-o: isto, sim, é poesia.

2º ATO

Não mescles palavras de sons semelhantes, sibilantes, errantes:
isto também não é poesia.
Se se quiser brincar com as palavras, com o dicionário imbecil
qualquer um pode fazer: e à sua maneira, não à tua. Logo,
é inútil o que procuras. Poesia ainda não é palavra: é verdade.
– Mas e a verdade?
Não interrompas o fluxo de minha fala, ainda não dei o texto todo.
Nem o decorei, e seria, de fato, inútil: a verdade também não está aí.
E poesia, então, também não: a verdade é a terra que hoje engoliu
os olhos daquele teatrator poeta: eles são a verdade.As palavras dele, nem as suas, nem as minhas a é:
a verdade a terra engoliu.

Não faças versos sobre acontecimentos: de absurda já basta tua pretensão.
Não faças versos sobre animais, flores, flora e fauna nojentas ou belas:
o grotesco ou o sublime não são isso. Nem existem sem a protagonista
que agoniza a verdade para mim, para ti. Para Ele, que levou a verdade junto...
Não procures poesia nos objetos da sua casa, no olhar amigo, no olhar excitado,
Na libido falsa de um pênis rígido: isso também não é poesia. Nem é grotesco.
É grosso e mentiroso: e a verdade é outra coisa.


Não te fixes em tragédias (irresponsáveis, que sejam) em três atos:
dois já bastam, desde que sejam a verdade.
Não faças análise literária: pelo amor de Deus!
Isso mata a poesia, o poeta, quem lê, quem finge que lê
quem ama, quem odeia, quem execra literatura,
quem exalta a mentira toda que tem nesse repertório de palavras
Mentirosas, mentirosas, cadê a verdade?

Não uses a erudição nem a segunda pessoa do singular!
Ninguém usa o tu hoje em dia: só a comédia de costumes ruinzinha,
uso agora para fazer uma sátira pobre, como tua rima terminada em ão
inho, eijo, eira, ura, ara, ará, erei, azia... etc. Etc. Etc.
Seja pobre na escolha vocabular: isso é ser simples
Seja pobre nas aulas de análise: isso é ser simples.
Seja pobre no cotidiano: isso é ser simples.
Mas não seja pobre ao olhar a verdade:
ela só se deixa surgir às vezes.
E para poucos... A mim foi há pouco e por pouco
também.
O Paulo Autran é que a detém.
Mas não sei se tem legado que se possa absorver:
minha pretensão é pouca: tenho medo da verdade,
porque podem aparecer aqueles que fingem sê-la!
E aí me confundo, porque com essa cegueira não dá.

Cantes, portanto, à verdade para que ela volte
com ele, ele que comove, consegue, condiz seu olhar
com o que a boca finge pronunciar,
mas não precisa: porque a verdade já está.

Repara: ermas de verdade, de conceito e de potência
As palavras nada traduzem, deixe-as em estado de dicionário.
Só as busques, e aí farás poesia, quando a verdade chegar,
quando a boca começar a pronunciar mas os olhos não deixarem:
Não precisa, porque aí a verdade já estará
contigo e isso é poesia.

(Blackout: foco na verdade dos olhos do ator)

FIM

Outroreando

Outrora te vi cantando,

Poetizando mundo a fora...

Outrora eu - você,

Todos, amizadeando...

Cumpliciando mundos a dentro...

Ourora uma nuvem

Dessas que, nuveando, o céu

Tapa.

E você que estrelado vira-o outrora

Negro o acredita agora.

Silêncio das estrelas

Que nelas unicamente guardam

A certeza de se acreditarem ali.

Não gritam, não esbravejam...

Outrora viste-me assim - estreleando

Se agora me olhas com olhos nublados

Nada faço.

Outrora olhei-o poetizando

Hoje ainda prefiro o passado

Saudades das noites de céu sem nuvem...

Outrora não o escrevia,

Sentir bastava.

Hoje escrevo e não me basto.

Poesia barata de estrelas que outrora

Silenciaram...



Ora vejam, século XXI e eu

Outrora.

Cheiro de passado

Gosto amargo das pegadas de águas

Que se foram...

E di rio que jamais voltará a ser o mesmo.

Passageiro

I

No terminal aguardo
A Minha vida passar.
Passa um ônibus fardo
Vai-se outro de pesar.

II

Espero a chegada d'alegria,
Porém para o carro razão
De ferro frio a lataria
Cinza, escuro, sem ilusão.

O Nelson

Como eu gostava de se enrabado pelo Nelson. O Nelson era meu câncer, que me consumia, e me invadia, e me enrabava gostoso, sempre oso meu Nelson, e me preenchia de gozos epiléticos, e me causava gemidos animalescos, e me traçava com aqueles instintivos e tão singulares movimentos de ida e volta, ora mais forte, me rasgando, ora suave, apenas me fazendo sentir cada centímetro e cada segundo daquele membro tão cheio de sangue. Como eu gostava de ser enrabado pelo Nelson de manhã, delícia, sentindo aquela coisa rígida tão bem feita por Deus, que com certeza já foi enrabado e por isso caprichou no Nelson e me deu ele de presente. Vai ver que é por isso que nossos gozos elétricos tinham esse caráter divino que me levava ao paraíso. Ou pode ser um caráter diabólico, vermelho, quente, muito fervente, gostoso, gozo, todo e qualquer oso... O Nelson era meu anjo demoníaco e como eu gostava de ser enrabado por meu demoniozinho afoito, o coito que nos matava, não, aliás, o coito não age sozinho: o Nelson era o culpado, era quem me matava, me deixava desfalecido dando gargalhadas à toa, gargalhadas lambuzadas de sexo, gargalhadas possuidoras de certa culpa pudica depois de jatos de despudor. Era inconcebível, pra mim, ser enrabado por alguém que não fosse o Nelson. É que o Nelson me despregava de um jeito só dele, num lugar só meu, num gozo tão cúmplice. Animais solidários após uma noite de cópula, que natureza pornográfica! O Nelson foi meu predador único.
Chegando em casa, um dia, o Nelson não estava me esperando com aquela arma dura apontada pra mim. Não estava lá, esperei, esperei, não sei cadê o Nelson, não podia pôr no jornal primeiro porque talvez ele voltasse logo e ficasse bravo, segundo porque eu queria o Nelson só meu, me enrabando e bombando em mim, só em mim.
Ele nunca chegou, nem poderia.

domingo, 21 de outubro de 2007

Severo

Errei
me arrependi
voltei
consegui me encontrar.
Vivi
não me preocupei
então recomeçou
e tive que trabalhar.
Impliquei,
compreensível.
Menti
era a minha obrigação.
Matei
mas eu não quis
ele pediu
tive que obedecer.
E ainda me chamam de covarde?
Eu que fiz mais do que achei que poderia?
Tudo isso porque um dia errei...
e errei porque amei.

A lua azul

Quando vi a lua azul
Os sonhos agonizantes!
Cantei uma canção de morte.
Eram velhas palavras frias...
Um vento brilhou na alma.
E esperanças carcomidas...
Era o sinal da derrota.
que não valem mais a distração
Morte fria e iludida e desacompanhada
de um ser que foi inventado
e que não existe.
Isso era na época em que se via a lua azul...

Mãos

As belas mãos que acenam
são enganosas.
Gosto das retraídas,
que não fazem nada e dizem tudo.

Mãos que nos remetem ao sonho
de um intocável toque que nunca virá,
ou que virá torto.
Torto é o toque.
Torta é a vida.
Torto é o poeta.
Tortas são as mãos.
As mãos que calam silenciosamente
o grito do silêncio contido
pelas mãos.

Mas as mãos podem imaginar
que o toque desejado é bem-vindo,
e sôfrega e pacientemente
levar ao paraíso dos desejos impossíveis
o tocado impaciente,
que aguarda
um enganoso gesto
da retraída mão
que não faz nada,
mas deseja.

sábado, 20 de outubro de 2007

Noturno II

Queria um poema como uma bala perdida
de maleita, de tristeza. E pássaros negros
como a íris dos seus olhos. Ter por musa Nêmesis,
e o barqueiro. Queria que fosse
seta de Cupido, que mirasse na cabeça.
Queria miolos expostos ao chão.

Saco

O meu tédio só é menor que o meu pé,
sou um morro de torpidez e disfarce
da minha incapacidade. Não há nada
depois de mim, nem antes.

Meus dedos são maiores que eu
e tudo me enoja e irrita...
Já não suporto mais a prosa
e quero que se exploda a poesia

Ontologia


I

Escrevi minha alma no vento
E a dei a você pensamento
Eterno volver do interno


II

Em castelos d'areia construo sonhos
E teu nome os faz pássaros risonhos
Interno revolver do eterno


sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Libido

I

Lambo os lábios em labor obsceno.
Vermelhas mãos em movimento.
Vejo em vida o vulvulante vaso
Da louca luxúria alimento.

II

Descende meu desejo desenfreado
Da libertinagem latina do lácio,
Espanhola espelhando lábio
Que devora libidinado.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

No asilo

Quando ele chegou, ela estava toda esporrada, lambuzada, lambendo a gosma que havia espirrado nos pulsos.
Ela ria, ria tanto e isso incomodou um pouco. Ele sabia o diagnóstico: insanidade; desequilíbrio mental, ele afirmava por aí. Mas o fato é que ela estava esporrada, molhada, lambuzada toda. E ria. Quem pode ter feito uma crueldade dessa com uma velha que nem normal está? Não obteve resposta nem do enfermeiro nem da polícia nem da esporrada feliz.
Ela não falava, só ria. Ria muito – com algumas pausas para respirar fundo e alimentar o pulmão fraco e podre. Resquícios do tabaco. Ela, sem dúvida, havia sido daquelas mulheres que bebem porra com gosto e vontade, aquelas em que os homens esporravam gritando e tremendo como bichos mais doidos que a velha. Essas mulheres gostam disso. Ela era uma dessas. E ria, ria sem parar.
Não dá pra deixar isso assim! – inconformado ele. Vamos investigar, mas não sei, não sei... – tranqüilos os caras de quepe.
Ela continuava a rir e ninguém – nem ele – prontificou-se a limpar a porra da barriga dela. Já estava secando e ela almejava ficar melada e pelada ali e, nesse caso, nem ele se atinou em cobrir a nudez dela. Seu sexo era enrugado, velhinho. Mas mais molhado e melado que o de muita gente. Mãe, pelo amor de Deus, pára de rir!
Ela obedeceu, virou-se e dormiu – nua e melada. Para não mais acordar.

No teu café

Te descobri hoje
no teu café,
no meu poema
pro teu café;
pra você, com café

Sem ele você não existe!

Te senti hoje longe, longe
com teu café
preto espumado, gostoso ele era
Mas te senti, perfumado e sem fé
Sem café nunca!

Sem ele você não pode existir!

Te vi hoje
como nunca antes havia feito
te olhei, sem jeito, de baixo pra cima
porque sou submissa
Ao seu café, claro

Sem ele você não gosta de existir!

Toma e retoma teu café,
Me retoma no teu café
Te retomo nas árvores
nos frisos
(do vinho e do teu cabelo)
Na xícara cheia –
Como você diz que esvaziou-se?
Esvaiu-se foi você, mas o café
ficou.

Sem ele você deve não existir...

Canto a você
Mais até ao teu café,

à xícara cheia, branca e espumada
Preto é o café e a Saudade
maldita, viciante
tua xícara (com teu café)
Te cantei hoje,
no teu café,
E durante ele você se calou por dentro
Num preto descafeinado
– porque é frio
Outrora não era, e tinha café fervente

Sem ele você não busca existir!

Te cantei hoje,
Em poema – este não mais
Truncado (nem trincado ou blindado)
Blindado é você:
Eu ainda sou o café
no teu café.
Do teu café eu falo...

Sem ele não deixo você existir.

Chute a pedra

Tinha uma pedra no caminho,
no meio do caminho tinha uma pedra.
Eu chutei a pedra que estava no caminho
e sossegadamente passei, de bicicleta.

Fernando e Guilherme

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Notícias

Em um ápice de dor e solidão, resolvi escrever essa carta pra você.
Por que não um e-mail? Sei lá, talvez porque a carta dá tempo de ser arrependida e rasgada. E o computador demora um pouco pra ligar. Solidão me dá preguiça. Gosto de curti-la, a solidão, na cama minha de solteiro.
Eu estava lendo Drummond, mas enjoei e fui ver televisão. Novela. Aí deu fome, fritei um ovo e pus no meio de duas fatias de pão integral – pelo menos seguro um pouco as calorias. Aí voltei pra minha cama de solteiro e continuei vendo novela. Hoje devem aparecer uns barracos legais até. Barracos por amor sempre me interessam. Por isso leio Drummond. Mas ele me causa uma solidão maior ainda, aí vou ver tevê, que é tão colega. Boa noite, Bonner.
Você não apareceu mais, não ligou mais, nada mais nunca mais. Não vou te perguntar por que, porque não quero abrir espaço pra você responder a carta. É uma carta que também deve curtir a solidão.
Ainda hoje, quando fui limpar a casa, lembrei de você. Achei sua toalha, aquela bordada com suas iniciais. Você não vai vir buscá-la mesmo, eu sei, demorei, mas fiz a toalha de pano de chão.
Agora ela está no varal, secando, amanhã vou passar no chão da sala, que está muito encardido. Imundo.

domingo, 14 de outubro de 2007

Nelson desdito

Desafio o sexo,
Nelson
desdigo os dias de gritos
gratos, despudores
dilatados aqueles gritos
que desafio, que desdigo
porque dói ainda dizer
e desdizer o desafio dito,
Nelson, desdizê-lo dói
É fogo, é diabo desafiado,
Nelson, dócil enrabada,
sexo sem dizer, sexo é desdizer
o dito, palavras brincando,
Nelson, não são sexo, são dizeres.
Digo o já dito sem medo
do Nelson, desdigo e é sexo,
Nelson, que me possui e grita, gratuito, e goza
e desdiz, logo é sexo...
Mas volto a dizer o dito,
Nelson, volto às palavras que brincam
e dizem sem desdizer;
o dito desdito é Nelson...
Desafio o sexo, desdigo já, pois.
Desdigo já. E é sexo,
Nelson.

sábado, 13 de outubro de 2007

Dom Quixote Desiludido.

Onde estará meu príncipe encantado?
Onde estará que não o vejo?
Cortejará uma princesa no Tejo?
Combaterá o Dragão conspurcado?

Aonde anda meu cavaleiro errante?
Preso em sítio encarcerado?
Lutando numa terra distante?
Aonde andará o meu errado?

Não sei, não distinguo, só sinto
A falta do lamúrio sucinto
Na infinda estrada enterrado
Por quimeras, sem fé, dissimulado.

Afinidade

Notas avulsas
Aquarelas líquidas
Cores afins
Letras, enfim
Misturas
Texturas
Uma infinidade de tons

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Toureiro

Se não pensasse nela, não haveria impaciência
Respaldo dado ao homem, abstração que torna-se coisa
coisa que volta-se noite. Se não imaginasse estar penso,
o leme não seria biruta e não valeriam as fórmulas na lousa.

Se não pensasse nela, seria um touro em angústia
e a vermelhidão não na bandeira (nos olhos), falsa.
Valsaria com a imprecisão dos ponteiros de um cuco melindroso,
e com a destreza de bailarinos: drible da vaca...

Senão verdadeira, a minha vida seria, noções de aritmética
porque mentira. Verdade contumaz dos medíocres...
sempre planejada... Transforma (ato pudico) o hermético no fim
em matéria popular os restos mortais, cientista empírico...

E ela... não falo disso, me custaria mais que papel
se o digo é como justificativa, não do depoente ou do réu,
mas do covarde, que para não dizer o que quer se esconde...
palavra! Se não fosse por ela não sei por onde!

Confraria

I

Ó flor do belo prado,
Despejas com amor tua beleza
Sobre o Eros mentiroso,
Encantas a bela virgem
Com o prazer do teu olor.

II

Das rugosas pétalas,
O afago amoroso
Esconde o acúleo desdém.
Pois que as flores focalizadas
Alimentam um narciso obscuro.



À Gustavo Scudeller.


quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Pudor Perdido

Pássaros passeiam elípticos
No horizonte origem do sonho
Zéfiro sussurra saboroso
Plumosas palavras de Eros
E a pálida Palas de pedra
Polida a pose pudorosa
Queda o queixo a cara cora

O poema dos saudosos (mortos)

Concentrado, concentradíssimo você escreve, você
estuda
belo e
truncado é o seu
estudo
e este poema sem sentido,
sem sentir
porém sensível e saboroso
é o ato de te ver

Gosto ainda mais de mirar
a xícara vazia
o café! Onde está?
Me dói não vê-lo, você adora café
eu também.
Quer dizer, gosto do que você toma
do café – este não morre –
que você tomava.

O café de outrora talvez não seja o de
agora.

O coqueiro-anão baloiça –
uso esse vocábulo pela saudade de sua erudição romântica –
Tornando o agora mais poético que o outrora.
Agora
Truncado?
Não mais amo o agora, amo
Só, de sozinha.
Serei romântica sem erudição?

O fato é que você exerce fascínio – este também
truncado –
sobre mim.

Isto era para ser um conto
Conto a você,
Preferi, porém, a forma
Desfocada da poesia besta
Porque, além do café, é dela que você gosta.

Se eu escrever agora:
“Olha pra mim, vai...”, será que você o faz?
Olha? Olha!
Não, não aconteceu.
Por onde anda o poder da arte?

O café de outrora talvez não seja o de
Agora

Não é.

Se eu parar de escrever
Aí você não me olha mesmo.
E o outrora não volta.
Nem o café.
Nem o agora.
Nem o coqueiro-anão.
Nem o conto (que era pra ser)
Nem o poema,
Que foi.

Toma.
Toma teu café.

Cronicazinha boba

Gosto de coisas curtas, literatura do ansioso, gosto de contos curtos e poemas que pareçam prolixos, que patinem, mas que sejam curtos. Gosto de ser repetitiva na arte do contar, mesmo quando conto ou canto em poema. Repetitiva porque só gosto de cantar à saudade, e de contá-la também, porque é ela quem me motiva. Não fosse sua existência, eu nem escreveria – e isso não seria, não, um bem para a humanidade letrada: se não gostarem de obsessões, não devem me ler mesmo. Gosto dos obsessivos, dos histéricos, dos saudosos, dos suicidas, dos insanos, dos fragmentados: gosto das mulheres. Gosto da feminice desvairada, tendo ataques de vaidade, de sangue: gosto quando desejamos morrer de amor. Escrevo para tornar minha vida não um conto (esses, na modernidade, têm um fim triste): gosto de imaginar coisas e saber que eu e ele teremos transmissão de pensamento, como na arte cinematográfica, e aí nos encontraremos. Busco construir minha vida como as cenas de filmes bonitas e românticas, mas não quero ter bem um final feliz. Não quero é que nada acabe: nem eu nem você. Ainda esses dias você me disse que acabou, não há fio de vida: como num filme, chorei. Mas como conheço os filmes, sei que os choros das moças são sucedidos logo (logo pra gente, demorado praquelas tristes personagens do filme... Passam-se, então, nove anos) por sorrisos na igreja. Sorrisos brancos em vestido de noiva. Gosto de patinar, patinar. Pra que chegar a algum lugar, se tudo o que é sólido se desmancha no ar?
Não mais devo escrever, o ansioso é assim: é a fragmentação do sujeito moderno chegando por aí...

Amor condicional

Se o meu abraço é um espasmo, louco me volto
cá fora minha alma se lamenta, não como os mendigos
lamento de pálpebras secretas dos amantes, de mortos:
retorno das múmias oceânicas no princípio dos dias.

Se as pestanas dilatam a minha mediocridade com seu paladar
de incêndio e suas barrigas de sono, em bicicletas
esqueço o incômodo no quarto de despejo e levanto calado.
Caiado é o sol que ilumina e desperta os 'escrevidos'.
Seus, se fossem meus seriam falsos - como te escrevo -

Acha graça! não há graça se as respostas são esgueiradas
se a poesia é condicional, a vida que eu não conheço,
visto que minha, se fosse sua seria menos vagabunda.
E sua e minha seria, se eu pudesse, pôr alegria.

Não canto o amor em poesia, canto o seu reverso
oh idiossincrasia! e odeio as exclamações em verso
se quisesse ser-me perverso, talvez não o faria.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Se

Ah! Se eu fosse um guerreiro
Da poderosa elite romana.
Eu a arrancaria de um mosteiro
E a arrastaria para minha cama.

Se não fosse eu um poeta,
Pobre e mísero romântico,
sem uma fé pra ser profeta,
sem uma balada ou cântico.

Se não perdesse tudo.
Se eu não tivesse medo,
talvez de ficar mudo,
talvez de morrer cedo.

Se tudo não me mudasse,
Se nada existir pudesse,
Eu teria toda a classe,
se o se não me tivesse.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Maçã

Alienadamente te devoro
esquecido de tudo.

Só duma coisa me ocupo:
Saber se tu és limpa!
Pelo menos na aparência
da casca vermelha.
Se fores bela, te comerei pois
o sabor, o sabor...
o sabor da vida eu esqueci.
E se és a morte, se o ácido, o tóxico
tu carregas. . .

Pouco me importo!

Antes tu comprada no Pão de Açúcar
que outra de um pé qualquer!