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quarta-feira, 12 de maio de 2010

Intervalo

Gosto mais daquela transa rápida, no tempo de um café. Intervalos são mais plenos do que as atividades à que eles se destinam. Porque trazem o homem naquilo que o coração dele gostaria mesmo de fazer naquele instante: tomar café, trepar sem combinar, fumar um cigarro, pensar no que a mente pedir. Gosto do intervalo. Gosto de coisas de uma sentada só, até do sexo, afinal, se raramente vou gozar mesmo, que a transa seja rápida, apenas para ativar qualquer coisa de carne que me torna humana.
Nesse intervalo, pensei naquele menino que toma e retoma o meu café, que ainda puxa o fio da minha meia-calça – não puxava, antes, mas puxa agora só porque ficou no passado e passado é muito melhor. Porque o passado só existe em nossos intervalos, quando podemos lembrar dele e buscar a dor da saudade deliberadamente. Na arrogância que me torna humana de planeta Terra, pergunto: o que é o tempo, afinal?
Minha mente responde, conectada com o infinito: foda-se o que é tempo. Tudo o que for tempo não importa. Foda-se o que é o tempo. Bom é saber que ele transforma minha consciência em sub-consciência ou em inconsciência diversas vezes por dia, em apagões que não lembro se tive porque são apagões. Esses apagões também me interessam, porque são intervalos da mente que fica evitando pifar. Mas não é no gerúndio que a vida acontece: é no instante entre o ponto-final, enter, tab, novo parágrafo. É no entre que a vida acontece. Por isso te peço: toma teu café, homem, toma teu café, que é ele que te pare, enquanto você pensa que está parindo belas idéias a serem esquecidas quando, na xícara, só resta um açúcar molhado.

3 comentários:

Fernando Cordeiro disse...

Oi Lê,
a quanto tempo!!! Li os dois, gostei mais desse... Esse negócio do momento, do intervalo, é bem legal (e está, no fim, expresso na descrição deste blog - que diga-se de passagem é bem simpática - porque o momento do terminal é um desses intervalos, o da ida pra algum lugar... Voltando ao poema: você retomando a questão do café sabe que eu não consigo deixar de fazer relações biográficas (que não vou comentar, só dar risada...). É bom ver que você mantem algumas "obsessões": as angustias do sexo e do passado (e uma certa nostalgia do passado que foi e do que não foi, ou melhor, do que poderia ter sido que surge como uma espécie de fantasma e atormenta), e a imagem do café...
Vou ler mais tarde e rever o que escrevi para ver se faz sentido...

Guilherme Mariano disse...

Oi,

Então, concordo com o fer, gostei mais desse do que do último que comentei, que é mais recente. Seu eu-lírico está menos frenético, mas ainda angustiado. Essa idéia da vida nos intervalos é muito legal, principalmente na relação que você faz de que o que não é intervalo não é natural, não é planejado. De que o intervalo sim se realiza naturalmente, e não racionalmente.
Interessante o saudosismo/ idealismo com o passado, esse passado guardado na memória, que vem inesperado, e desfia sua meia calça, mas que ao ser rememorado, se destrincha em racionalidade, e quando se vê, só resta o açucar borrado.

Cristiano Gouveia disse...

O tempo de um café, sem açucar, sem afeto...