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domingo, 28 de novembro de 2010

Outro velho

"como manteiga que foi espalhada num pedaço muito grande de pão"
Bilbo Baggins
Eu estou cansado...
há uma âncora em minha alma.
Além de me manter parado, pesa,
me segura focado em meus erros.

Disfarço, pesa a máscara também,
um oceano sobre os ombros
sempre me afogo, tática terrorista,
Sou um homem-bomba, sem missão,

Sem objetivo, minha via-crúcis
é uma estrada, de caminhões lotada
e plana, vejo-a como o horizonte
embaçado, em ebulição.

Um horizonte eterno e maçante,
de sem esperanças esperançoso se estica
se esvai, mergulho no torpor
tudo parece lento, surdo, patético...

De gatos

um gato atravessa a rua
por entre lixo e entulhos
encontra seu lugar
um gato, é a resposta para todos
os problemas que um gato pode ter
ninguém imagina um gato, um
simples, pequeno de qualquer cor,
mas gato. Diriam que não há gatos
que eles são furtivos, interesseiros,
os gatos. Diriam que eles são uma metáfora
em forma de gato, mas, de fato, para quê?
Alguém não poderia falar de gatos,
de asfaltos, mas por que o lixo?
Gatos gostam, mas, enfim, quem não?
Contava, um gato atravessava a rua
devagar, não tinha pressa, mas
tenho quase certeza de que era um gato

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Ontológico Revisitado

Gosto dos desejos azuis
que flutuam no universo
da minha consciencia negra

Véu branco de noiva
e cortina de palco
são o fim do espetáculo.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Quase confuso

quase comecei a escrever um poema
era um coisa besta, meio lenta
meio presa, mas saia com naturalidade
Me engano se penso, mas é tudo verdade
Outro dia vi um homem sem pernas caminhando
ou lembrei de um poema com mesas a dançar...
Não importa, eu invento tudo, mudo
volto e ignoro o que é surdo
mas, ontem, ao contrário de outro dia,
esqueci de escrever tudo aquilo
que antes me admirava, um dia na praia,
o futebol na pracinha, o filme no cinema
a cama no meio da noite, a mesa no meio-dia
pra que começar um poema e parar a vida?

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Fome

De repente vem uma vontade de repente
Uma vontade de repente vem quente

Vem uma vontade repentinamente

De repente uma vontade toma conta
Uma vontade vermelha apronta

Um desejo assoma
domina a mente
uma semente
coma.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Elegia diária (revisitada)

Meus poemas estão ficando velhos
Ou talvez seja só a noite e a idade
o papel amassado e a dor nas juntas
os olhos fracos, enevoados pelos anos
tantos sem memória.

A página branca toma conta do olho
e o negro dia vai iluminando a noite
separando as nuvens do ocaso branco
céu sem leito para o vermelho
para o ranger de dentes.

sábado, 10 de julho de 2010

Das trocas (primeira versão)


Um poema por dia
Não faz uma vida
mais rica ou viva
nem viva de alegria

Outra alma vivida
pura em plena putaria
todos os poemas troca
por uma puta por hora.

domingo, 4 de julho de 2010

Das trocas (Revisitado)

I
Um poema por dia
realiza uma vida
pobre ou rica
em toda galhardia

II
Uma alma vivida
pura em plena putaria
todos os poemas troca
por uma puta por hora.

domingo, 27 de junho de 2010

Fábula pós-mderna

        I

Um gato olha um espelho
No silêncio do escuro
seu olho cravo no velho
pretérito do futuro

       II

Uma mão desce o ferrolho
Duma porta para o dia
O aceso enfado d'olho
noutro espelho parodia

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Vinum veritas est?

Os poemas para o cânone
são como o vinho para um conoisseur.

Quando jovens são
por demasiado
incompletos

Falta a consistência do selo de garantia.

Quando velhos
exilados em seus barris de carvalho

amadurecidos pelos anos
são néctar
ambrosia
provada em cristal.

Mas a incerteza é a mãe
da pergunta infiel:

Qual é a medida da idade
para um gordo conosseiur
que não quer tomar sangria
não se engasgar com vinagre?

terça-feira, 18 de maio de 2010

(pós)moderno

Um sol tingido de sangue ralo
não faz diferença quem pintou
descobrissem que foi manchado
não era peça de colecionador

Cotidiano

o dia estava claro
dum azul retumbante.

Eu olho a estante
e esqueço do trabalho.

Descalço me olho
no espelho descarnado.
A barba penica os dentes,
a fome devora o assoalho,
num risco perdido de gentes

o sol, mais vivo, de repente
tinge de sangue meu terno
no bolso percebo novamente
o gosto dos dias de inverno

sem pressa viro o café
de dias que nem se sente,
mas quando do espelho
foge um palhaço, é certo
mais um dia me desfaço,
imito um projeto doente.

Roda gigante

em duas versões

I

uma roda-gigante.
Uma profusão de luzes e cores
rastejando no ar tempo.
era sem dúvida, uma rarefeita
agitação despreocupada de ser
moça, desabitada de batom
destronada de realeza.
Nessa ofuscante e entusiasmada
sensação viam se lágrimas
talvez

II

Era uma roda-gigante,
sem forma,
uma profusão de luzes e cores
rastejando no ar-tempo.
Era sem dúvida uma rarefeita
agitação despreocupada de beleza,
despreocupada de vida, destronada de honra.
Nessa desnorteante e entusiasmada
ilusão perdeu

seu coração

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Patinando

É difícil a escuta, prefiro falar, falar, falar, porque preciso me expressar, porque passei sabe-se lá quanto tempo pedindo pra Deus me mandar pra Terra, então me deixem falar, falar, falar. Já escutei demais, agora quero falar. Preciso falar, porque sou a típica artista insatisfeita com seu contexto, então preciso me expressar, expressar muito, preciso por pra fora toda a ânsia de ser humana. Preciso, preciso muito, não quero, mas preciso, essa ânsia desesperada e ansiosa de querer falar está me tirando do meu famoso centro, coisa que artistas sempre ouvem mas nunca sabem o que é, porque se eles forem ao centro deles vão fazer a arte Divina, e não é isso que os artistas querem, eles querem fazer a arte medíocre típica de um ser feito de um pedaço de carne dura, tensa, embaraçada, envenenada, adoecida.
Preciso falar, falar pra me curar, é a cura na língua que precisa se limpar do veneno de ser compulsiva por ficar presa ao céu da boca e não expressar aquilo que o coração (de)manda. Muito tempo com a língua no céu da boca, grudada, hora de falar, de colocá-la entre os dentes.
Depois, a língua sangrou. Tanto tempo sem falar, que me perdi no movimento e não soube o que era falar. Reivindiquei tanto, mas descobri agora que não sabia bem o que era falar, reivindiquei sem saber, mas o desespero do momento me dominou, porque precisava me expressar. Com a língua mordida, ou cortada por vocês, que, de tão irritados, me deixaram nervosa e me fizeram esquecer a arte do falar, com essa língua massacrada, agora escrevo, escrevo, escrevo. E não digo nada.

Intervalo

Gosto mais daquela transa rápida, no tempo de um café. Intervalos são mais plenos do que as atividades à que eles se destinam. Porque trazem o homem naquilo que o coração dele gostaria mesmo de fazer naquele instante: tomar café, trepar sem combinar, fumar um cigarro, pensar no que a mente pedir. Gosto do intervalo. Gosto de coisas de uma sentada só, até do sexo, afinal, se raramente vou gozar mesmo, que a transa seja rápida, apenas para ativar qualquer coisa de carne que me torna humana.
Nesse intervalo, pensei naquele menino que toma e retoma o meu café, que ainda puxa o fio da minha meia-calça – não puxava, antes, mas puxa agora só porque ficou no passado e passado é muito melhor. Porque o passado só existe em nossos intervalos, quando podemos lembrar dele e buscar a dor da saudade deliberadamente. Na arrogância que me torna humana de planeta Terra, pergunto: o que é o tempo, afinal?
Minha mente responde, conectada com o infinito: foda-se o que é tempo. Tudo o que for tempo não importa. Foda-se o que é o tempo. Bom é saber que ele transforma minha consciência em sub-consciência ou em inconsciência diversas vezes por dia, em apagões que não lembro se tive porque são apagões. Esses apagões também me interessam, porque são intervalos da mente que fica evitando pifar. Mas não é no gerúndio que a vida acontece: é no instante entre o ponto-final, enter, tab, novo parágrafo. É no entre que a vida acontece. Por isso te peço: toma teu café, homem, toma teu café, que é ele que te pare, enquanto você pensa que está parindo belas idéias a serem esquecidas quando, na xícara, só resta um açúcar molhado.